Nos países
autocráticos, os cidadãos usam o rótulo apolítico para fugir do ônus de dar
opinião sincera sobre o seus governantes e líderes partidários. Eles afirmam
“não ligarem para a política” e em seguida procuram dar as costas, ou
simplesmente manifestar assentimento, sincero ou fingido, às medidas
implementadas pela elite administrativa. Eventuais discordâncias figuram em
conversas particulares ou apenas são ditas em contextos nos quais se sabe que
não haverá grande repercussão. Trata-se de manobra simples e que pode evitar
dor de cabeça, seguindo a regra da sobrevivência e autopreservação.
Porém, os apolíticos das
regiões onde há relativa liberdade podem tomar esse termo com outros contornos (devemos
dizer liberdade relativa, uma vez que liberdade total é impossível e a ampla
apenas existe em países bem específicos), estamos falando sobre os países nos
quais ainda é possível publicar textos, vídeos e formar associações em torno de
ideias comuns, existe uma série de meios associativos e comunicativos, seja
para finalidades ideológicas ou temas de interesses variados, cuja falta
somente é sentida após a sua supressão.
No campo específico das
pílulas, por ser mais ampla e representativa do conceito de verdade, mantendo a
coluna vertebral do masculinismo, a pílula vermelha é denominação mais
interessante de se utilizar. Depois de muitas andanças, o discurso travado
dentro da ideologia centrada em temas masculinos passou por diferentes focos.
Por uma via, seguiu-se a linha do entendimento das mulheres para poder
conquistá-las (com os Pick-Up Artists – artistas da sedução); por outra, havia
a linha que trabalhava a masculinidade no sentido de buscar o modelo alpha,
exaltando os atributos de atores famosos que se aproximavam desse modelo. Mas
também há vertentes no sentido de que o sistema não deve ser domado ou
enfrentado, no máximo boicotado e contornado.
A ideia é de que o
sistema passa a ser desprezado, os meios de mudá-lo também. Isso conduz a um
valor comum de apatia, que será agravado pelo fundo ideológico pós-moderno, uma
série de componentes cuja combinação resulta quase sempre na pílula preta, que
também carregará suas contradições. Daí decorre que embora a pílula vermelha
seja associada ao mgtow, ela é mais ampla que este, que possui a característica
de estado (do verbo estar). Ser homem, estar solteiro e sem qualquer tipo de
relacionamento.
Pois bem, como esse
niilismo foi sendo progressivamente inserido na redpill, criou-se no meio um
senso de que falar em redpill é também falar em quebra não apenas da matrix de
relacionamentos, mas também da matrix religiosa, do trabalho, da política e
assim por diante, transformando esse panorama de assuntos como algo a ser
desconstruído (uma atividade muito cara às antifilosofias pós-modernas). E aí
chegamos ao ponto no qual se afirma que os que discutem o feminismo precisam
ser apolíticos. Como se criou essa atmosfera de aversão às discussões centrais
do poder, até mesmo as opiniões sobre isso precisam ser emitidas de uma forma
suavizada, indireta ou aparentemente fundida com o interesse masculino, como se
as pessoas estivessem com receio de falar de maneira clara as suas posições.
Daí as preocupações de
sempre deixar claro coisas como: “Sou apolítico”, “Os vídeos relacionados aos
temas masculinos não tratam de política” ou, para ser mais específico, “O mgtow
é apolítico”, etc...
Porém, essa atitude
melindrosa não tem razão de ser. É necessário estabelecer dois pontos.
O primeiro é que essa
base metafísica do vazio não merece respeito algum; é um corpo estranho que foi
enxertado na pílula vermelha e passou, com as constantes repetições de
conteúdos semelhantes, a ser enxergada como se fosse própria da redpill e de suas
variações, seguindo a linha de uma alegada nobre tarefa de desmascarar as
farsas sociais. Ela traz consigo toda a base comum relativista e
desconstrucionista que gerou as complexidades destrutivas com as quais o homem
se bate. Portanto, é necessário deixar claro que todo esse fingimento afetado,
esse "charminho" e essa repulsa ostensiva a temas políticos, como se
se estivesse acima ou distante do debate, não passam de artifícios. O charminho
apolítico não passa de uma bichice ridícula. Homens discutem política, sempre
discutiram e sempre discutirão.
Em segundo lugar, dificilmente
se vê alguém que se declara “apolítico” que não venha depois querer “mandar a
real” sobre política a torto e a direito, o que faz do apoliticismo uma cartada
para poder entrar nessas discussões sem parecer estar entrando. Assim ocorre que, sempre que se estiver
diante de alguém muito preocupado em pintar-se de afastado e indiferente à
política, espere uma caçamba de palpitaria e opiniões definitivas sobre os
principais acontecimentos do jogo do poder. Os verdadeiros indiferentes
simplesmente o são, eles não usam essa palavra como armadura, casca, artifício
ou ardil para disfarçar suas convicções.
Notem que não se dizem
antipolíticos, mas apolíticos, como se estivessem justamente DE FORA da arena e
dos comentários sobre a disputa do poder, seja no plano nacional, seja no
geopolítico. Mesmo porque dizer-se antipolítico não faz sentido algum, já que
nesse caso haveria adoção de uma postura sobre o assunto, passando também a um
posicionamento partidário de negação de todas as correntes. Em suma, ou você é
apolítico, desinteressado, indiferente e sem opinião alguma a manifestar, ou
discute política e julga os agentes políticos.
Se você é apolítico,
então seja de fato, tomando como óbvio que isso implica em não procurar
discutir nem julgar agentes políticos, nesse caso, toda essa arena é como se
fosse um nada. Os verdadeiros apolíticos estão preocupados com a disputa do
poder da mesma forma como eu estou preocupado com jogos de futebol, algo que
para mim não tem importância alguma. Não sei o que Neymar está fazendo, não sei
quem está na série tal e qual, se o time foi rebaixado ou se deram a bola de
ouro para fulano ou sicrano. Não só não sei como não quero saber, os apolíticos
fizeram a sua escolha e ela é exatamente essa: agir como se suas vidas nada
tivessem a ver com os movimentos de disputa pelo poder.
Esse tipo de apolítico,
o verdadeiro, não faz o truquezinho vagabundo de ir palpitando sobre Lula,
Bolsonaro, conservadores, direitistas, esquerdistas, etc...e depois, para não
ser tragado para uma discussão, levanta um escudo e põe uma máscara de
indiferente, com aquela cara de sonso, como se fosse um estranho ao embate
ideológico próprio das correntes de pensamento, como se estivesse mesmo desligado
da luta neurótica do poder, da militância e teorias correlatas, alguém que
apenas vive sua vida, com a fantasia do homem comum que não se informa está com
os pés no chão e que imagina está mais perto da realidade do que aqueles que
tratam das correntes ideológicas, as quais considera como superficialidades e
distrações da massa.
O falso apolítico com frequência usa esse
carimbo para, num primeiro momento, atribuir a si mesmo uma aura insuspeita,
procurando transmitir ao público a impressão de que tem uma mente saudável e
equilibrada; no outro instante, já passa a proferir juízos como se fosse um oráculo
ou árbitro, com voz neutra empostada, imparcial e esclarecida contra a turba
que fica discutindo ideologias, partidos, governos, em suma, o poder.
A verdade é que se
alguém realmente se declara indiferente aos debates públicos, é porque não tem
absolutamente nada a dizer nem a ser considerado, essa pessoa necessita seguir
o rumo dela, dedicando-se à sua área de especialidade e de interesse. Ademais,
todos os que enchem a boca para falar são apolíticos e, momentos depois, estão
tratando de questões atinentes a esse tema, devem ser cobrados: por que você
mentiu? Por que se utilizou da pilantragem de jogar para a galera uma imagem de
distância e desinteresse para depois então emplacar as posições que, no fundo,
sempre estiveram presentes.
Essa é uma das razões
fundamentais pelas quais você deve cagar sempre que alguém disser que o
masculinismo é apolítico. Se você estiver tratando de temas ideológicos, o
apolítico não irá se importar; se por acaso alguém se importar, é porque nunca
foi apolítico, portanto o estranhamento ideológico haverá razão de ser nesse
caso, um correligionário de uma ideologia estará se chocando contra outra
ideologia. Nesse último caso os polos estão em evidência ou confessadamente
posicionados, o que não pode haver em hipótese alguma, devendo ser identificado
e denunciado sempre, é a figura do dissimulado, que enche a boca para falar que
odeia política, mas no momento seguinte está mergulhado em discussões dessa
natureza.
Nenhum comentário:
Postar um comentário