quarta-feira, 2 de julho de 2025

“Sou apolítico”: uma cartada usada para depois sair “mandando a real" sobre política

 


Nos países autocráticos, os cidadãos usam o rótulo apolítico para fugir do ônus de dar opinião sincera sobre o seus governantes e líderes partidários. Eles afirmam “não ligarem para a política” e em seguida procuram dar as costas, ou simplesmente manifestar assentimento, sincero ou fingido, às medidas implementadas pela elite administrativa. Eventuais discordâncias figuram em conversas particulares ou apenas são ditas em contextos nos quais se sabe que não haverá grande repercussão. Trata-se de manobra simples e que pode evitar dor de cabeça, seguindo a regra da sobrevivência e autopreservação.

Porém, os apolíticos das regiões onde há relativa liberdade podem tomar esse termo com outros contornos (devemos dizer liberdade relativa, uma vez que liberdade total é impossível e a ampla apenas existe em países bem específicos), estamos falando sobre os países nos quais ainda é possível publicar textos, vídeos e formar associações em torno de ideias comuns, existe uma série de meios associativos e comunicativos, seja para finalidades ideológicas ou temas de interesses variados, cuja falta somente é sentida após a sua supressão.

No campo específico das pílulas, por ser mais ampla e representativa do conceito de verdade, mantendo a coluna vertebral do masculinismo, a pílula vermelha é denominação mais interessante de se utilizar. Depois de muitas andanças, o discurso travado dentro da ideologia centrada em temas masculinos passou por diferentes focos. Por uma via, seguiu-se a linha do entendimento das mulheres para poder conquistá-las (com os Pick-Up Artists – artistas da sedução); por outra, havia a linha que trabalhava a masculinidade no sentido de buscar o modelo alpha, exaltando os atributos de atores famosos que se aproximavam desse modelo. Mas também há vertentes no sentido de que o sistema não deve ser domado ou enfrentado, no máximo boicotado e contornado.

A ideia é de que o sistema passa a ser desprezado, os meios de mudá-lo também. Isso conduz a um valor comum de apatia, que será agravado pelo fundo ideológico pós-moderno, uma série de componentes cuja combinação resulta quase sempre na pílula preta, que também carregará suas contradições. Daí decorre que embora a pílula vermelha seja associada ao mgtow, ela é mais ampla que este, que possui a característica de estado (do verbo estar). Ser homem, estar solteiro e sem qualquer tipo de relacionamento.

Pois bem, como esse niilismo foi sendo progressivamente inserido na redpill, criou-se no meio um senso de que falar em redpill é também falar em quebra não apenas da matrix de relacionamentos, mas também da matrix religiosa, do trabalho, da política e assim por diante, transformando esse panorama de assuntos como algo a ser desconstruído (uma atividade muito cara às antifilosofias pós-modernas). E aí chegamos ao ponto no qual se afirma que os que discutem o feminismo precisam ser apolíticos. Como se criou essa atmosfera de aversão às discussões centrais do poder, até mesmo as opiniões sobre isso precisam ser emitidas de uma forma suavizada, indireta ou aparentemente fundida com o interesse masculino, como se as pessoas estivessem com receio de falar de maneira clara as suas posições.

Daí as preocupações de sempre deixar claro coisas como: “Sou apolítico”, “Os vídeos relacionados aos temas masculinos não tratam de política” ou, para ser mais específico, “O mgtow é apolítico”, etc...

Porém, essa atitude melindrosa não tem razão de ser. É necessário estabelecer dois pontos.

O primeiro é que essa base metafísica do vazio não merece respeito algum; é um corpo estranho que foi enxertado na pílula vermelha e passou, com as constantes repetições de conteúdos semelhantes, a ser enxergada como se fosse própria da redpill e de suas variações, seguindo a linha de uma alegada nobre tarefa de desmascarar as farsas sociais. Ela traz consigo toda a base comum relativista e desconstrucionista que gerou as complexidades destrutivas com as quais o homem se bate. Portanto, é necessário deixar claro que todo esse fingimento afetado, esse "charminho" e essa repulsa ostensiva a temas políticos, como se se estivesse acima ou distante do debate, não passam de artifícios. O charminho apolítico não passa de uma bichice ridícula. Homens discutem política, sempre discutiram e sempre discutirão.

Em segundo lugar, dificilmente se vê alguém que se declara “apolítico” que não venha depois querer “mandar a real” sobre política a torto e a direito, o que faz do apoliticismo uma cartada para poder entrar nessas discussões sem parecer estar entrando.  Assim ocorre que, sempre que se estiver diante de alguém muito preocupado em pintar-se de afastado e indiferente à política, espere uma caçamba de palpitaria e opiniões definitivas sobre os principais acontecimentos do jogo do poder. Os verdadeiros indiferentes simplesmente o são, eles não usam essa palavra como armadura, casca, artifício ou ardil para disfarçar suas convicções.

Notem que não se dizem antipolíticos, mas apolíticos, como se estivessem justamente DE FORA da arena e dos comentários sobre a disputa do poder, seja no plano nacional, seja no geopolítico. Mesmo porque dizer-se antipolítico não faz sentido algum, já que nesse caso haveria adoção de uma postura sobre o assunto, passando também a um posicionamento partidário de negação de todas as correntes. Em suma, ou você é apolítico, desinteressado, indiferente e sem opinião alguma a manifestar, ou discute política e julga os agentes políticos.

Se você é apolítico, então seja de fato, tomando como óbvio que isso implica em não procurar discutir nem julgar agentes políticos, nesse caso, toda essa arena é como se fosse um nada. Os verdadeiros apolíticos estão preocupados com a disputa do poder da mesma forma como eu estou preocupado com jogos de futebol, algo que para mim não tem importância alguma. Não sei o que Neymar está fazendo, não sei quem está na série tal e qual, se o time foi rebaixado ou se deram a bola de ouro para fulano ou sicrano. Não só não sei como não quero saber, os apolíticos fizeram a sua escolha e ela é exatamente essa: agir como se suas vidas nada tivessem a ver com os movimentos de disputa pelo poder.

Esse tipo de apolítico, o verdadeiro, não faz o truquezinho vagabundo de ir palpitando sobre Lula, Bolsonaro, conservadores, direitistas, esquerdistas, etc...e depois, para não ser tragado para uma discussão, levanta um escudo e põe uma máscara de indiferente, com aquela cara de sonso, como se fosse um estranho ao embate ideológico próprio das correntes de pensamento, como se estivesse mesmo desligado da luta neurótica do poder, da militância e teorias correlatas, alguém que apenas vive sua vida, com a fantasia do homem comum que não se informa está com os pés no chão e que imagina está mais perto da realidade do que aqueles que tratam das correntes ideológicas, as quais considera como superficialidades e distrações da massa.

 O falso apolítico com frequência usa esse carimbo para, num primeiro momento, atribuir a si mesmo uma aura insuspeita, procurando transmitir ao público a impressão de que tem uma mente saudável e equilibrada; no outro instante, já passa a proferir juízos como se fosse um oráculo ou árbitro, com voz neutra empostada, imparcial e esclarecida contra a turba que fica discutindo ideologias, partidos, governos, em suma, o poder.

A verdade é que se alguém realmente se declara indiferente aos debates públicos, é porque não tem absolutamente nada a dizer nem a ser considerado, essa pessoa necessita seguir o rumo dela, dedicando-se à sua área de especialidade e de interesse. Ademais, todos os que enchem a boca para falar são apolíticos e, momentos depois, estão tratando de questões atinentes a esse tema, devem ser cobrados: por que você mentiu? Por que se utilizou da pilantragem de jogar para a galera uma imagem de distância e desinteresse para depois então emplacar as posições que, no fundo, sempre estiveram presentes.

Essa é uma das razões fundamentais pelas quais você deve cagar sempre que alguém disser que o masculinismo é apolítico. Se você estiver tratando de temas ideológicos, o apolítico não irá se importar; se por acaso alguém se importar, é porque nunca foi apolítico, portanto o estranhamento ideológico haverá razão de ser nesse caso, um correligionário de uma ideologia estará se chocando contra outra ideologia. Nesse último caso os polos estão em evidência ou confessadamente posicionados, o que não pode haver em hipótese alguma, devendo ser identificado e denunciado sempre, é a figura do dissimulado, que enche a boca para falar que odeia política, mas no momento seguinte está mergulhado em discussões dessa natureza.  

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